quinta-feira, 25 de maio de 2017

Todo trabalho não é social? parte 1 e 2

Todo trabalho não é social? Texto em 5  partes:

1.    Trabalho e crescimento = relatividade

Sou de uma geração em que a compreensão  linear do tempo obrigava a todos querem sempre mais, uma certa lei da evolução que dizia que temos que melhorar sempre. Tá, tudo bem, mas se o melhorar é sinônimo de avançar, Cabe a pergunta: o que é avançar? Conseguir um posto mais visado no mercado: isso é avançar ou melhorar? Alcançar um alto cargo equivale a avançar? Crescer na carreira significa sempre ocupar um cargo mais alto?

Essas perguntas são capazes de fazer uma professora ficar sem dormir, por dias. Pois que as crianças, em torno de 200 com quem uma professora hoje tem contato quase diário, saíram da escola pensando assim. E encontrarão na frente, ali adiante, um mercado. Um mercado de trabalho. 

Mas como é ou como deveria ser um mercado de trabalho?

    2.  Trabalho e mercado = lotação esgotada

O que é o mercado de trabalho? Primeiro faremos a pergunta: o que é mercado? Aquele lugar onde estão expostas as mercadorias de diversas marcas diferentes as quais você deverá (supostamente) escolher uma e comprar. Mas normalmente a sua escolha vai mais pelo preço, e não pelo valor. Dificilmente você escolhe pelos ingredientes ou pelos produtos utilizados para aquele resultado. Certo? Talvez isso esteja mudando.

Também como professora  faço parte de uma geração inflada, em que os gráficos apontavam sempre que teríamos problemas, que não haveria espaço e trabalho para todos no mercado. Qual seria a solução? A solução é a competição. Mas para competir num mercado, seremos escolhidos provavelmente não pelo valor, mas sim pelo preço. 

Assim também é a tal lei “natural” de Newton, a qual diz que precisamos eliminar os mais fracos, isso tomado como uma característica da nossa natureza. Lobato mostrou bem isso, é só ler “A reforma da natureza” e outros textos dele também,  vale a pena. 

Nesse cenário o conflito  mesmo não é apenas a forma com a qual  resolvemos o problema, o desemprego. Trata-se de como o termo trabalho é compreendido hoje é como está sendo modificado. Tudo bem, sabemos que assim como a língua é viva, o trabalho também se modifica. Se a língua se modifica no uso que fazemos dela, também o mesmo ocorre no trabalho.  

Mas o que é o trabalho? E qual é o uso que fazemos dele?

   Vejamos no outro post.


Todo trabalho não é social? Parte 3 e 4

     3. Mas o que é trabalho?

O trabalho com compreendemos tem a ver com esse tal mercado, um local onde suas habilidades e conhecimentos ficam a disposição para os empregadores usufruírem, e pagarem por isso.

Qualquer que seja o empregador, seja rico, classe média,  sempre estará atrás de algum serviço a ser prestado para servir a sociedade. Sim a redundância aqui foi proposital, “um serviço para servir” a alguém.

Portanto, o trabalho, seja ele qual for, é sempre social. Estará sempre a serviço de alguém.  Desafio a encontrar um trabalho que não tenha como característica servir alguém. Difícil. Eu não encontrei nenhum até hoje. Em qualquer profissão que pense, sempre estamos servindo, padaria, vestimentas, limpeza, ensino, tudo é sempre com o intuito de servir ou melhorar a vida do outro, seja o conhecido ou um desconhecido.

Vamos lá, se pensarmos num trabalho com a tecnologia, o TI – tecnologia da Informação, mesmo lidando com máquinas e linguagens de máquinas, sistemas e computadores o trabalho terá sempre como destino final facilitar a vida de alguém. A criação de serviços online, bancos, compras, tudo o que não vemos, tudo o que a máquina faz, tem como finalidade nós, o nosso bem estar. 

Se vivêssemos no tempo do escambo, da troca, poderia ser diferente. Mas será que não vivemos ainda neste tipo de escambo com o dinheiro? Talvez para isso sirva o dinheiro, para que possamos servir também a desconhecidos. Para que o escambo e a troca de serviços seja comum também entre estados diferentes, entre países até.   

Mas o que me pergunto é: porque todo o trabalho hoje em dia não é mais considerado como social?


  4.   Por que todo o trabalho hoje não é considerado mais social?

Por exemplo: o trabalho social agora é compreendido como penalidade nos julgamentos da justiça oficial. Uma pessoa, quando considerada culpada por cometer um crime, ela cumpre uma pena, recebe uma punição. Mas me questiono: como uma diminuição de pena pode equivaler a prestação de um serviço social? Ou seja, como um tempo de prisão, que equivale a um castigo, pode ser substituído por um trabalho social? Se pensarmos nos políticos, quando têm a sua pena reduzida em troca de trabalhos sociais a conta não fecha. Pois não é o trabalho dos políticos melhorar e criar serviços para o bem estar social, o bem da sociedade?

Sempre me intrigou o nome trabalho social, como se todo o trabalho não fosse já social. Até aí uma reflexão sobre o sentido que damos ao termo, normal. 
Mas, a questão principal é: Todo o trabalho não é social?
 Existe algum que não seja em prol do outro, para o bem do outro? Os presos estão privados também do direito ao trabalho, então o acesso ao mercado de trabalho é um valor para esta sociedade? Se é um valor, então estar empregado é importante, no emprego você fará trabalho em prol de um outro. Logo, você fará um trabalho que é em prol da sociedade, um trabalho social. Então qual é a relação com o trabalho que estabelecemos hoje, para que o resultado de uma ação contra a lei, como punição, seja um trabalho social? 





Todo trabalho não é social? parte 5

5. O valor do trabalho 

O que vemos é uma exacerbação do valor do trabalho, do “ter um trabalho”, e uma diminuição do valor do trabalho em si, ou do trabalho como uma função social. A lei da competição preconiza isso. Nas relações entre o produto e o capital, também é assim. Quanto mais se tem disponível, menos valor se pode cobrar. Até faz algum tipo de coerência, se  pensarmos em produtos, mas ao pensarmos  em pessoas, fica bastante absurdo.  Indico a leitura do livro de Carolina de Jesus, “O quarto de despejo”para essa reflexão,.

Outro tipo de trabalho é o trabalho escravo, o que ainda é visto aqui no Brasil. Consta o caso da uma fazenda no ano 2000, no Pará, que foi denunciada e julgada por uma Corte interamericana de Direitos Humanos. Assim como o trabalho escravo, outras pistas de como damos valor ao trabalho, ou de como valoramos o trabalho hoje. De como colocamos um valor quando damos um preço para os trabalhos de hoje. Indico também um  filme antigo, 1,99. Da época em que haviam lojas que cobravam o valor de R$1,99 para quase tudo que havia para vender. 

       Sem esgotar, sigo perguntando: quanto vale o seu trabalho? Ou quanto deveria valer? Seria um exercício pensar, não em termos financeiros. Se pensássemos nos valores de forma diferente do mercado de trabalho. Como você faria essa valoração? Como você etiquetaria cada uma das funções da sociedade, do que precisamos hoje para viver? Do que você precisa para viver, de que forma você  etiquetaria os preços destas funções da sociedade. 





quinta-feira, 11 de maio de 2017

PEDRO II: por uma Rés Pública 1

Por uma Res-pública
Por uma releitura da proclamação da república, ou da Res-pública em 2 capítulos, por enquanto.

1.       Pedro II   e a Republica    

O mundo, ou melhor, o Brasil está repleto de nomes de Ruas, parques ou locais públicos homenageando algum personagem histórico.  Os acontecimentos dos últimos meses, se vistos por esse lado, enfatizam uma outra perspectiva que me faz pensar além dos nomes históricos das instituições. Num desencadear de pensamentos faço uma releitura. Não uma releitura do descobrimento, como fizeram os modernistas, mas sim numa releitura da proclamação da República do Brasil.

A primeira pergunta que faço é: quando e porque o país deixou de ter o regime de monarquia federativa presidencialista e passou a República? Ao compreender que hoje o cargo político do presidente da república é para o “sempre” da vida, até a morte; penso em como temos semelhanças que continuam ocorrendo desde aquela época da independência. São monárquicos os salários e auxílios de presidentes e ex-presidentes recebidos até a morte de cada um deles. Essa seria uma pergunta que gira em torno da polêmica da aposentadoria, do fundo de pensão etc. Mas, por merecer um estudo mais aprofundado, não me arrisco a abordar mais sobre este assunto.

O segundo ponto é o que faz agora me questionar sobre Pedro II. Com o intuito de reler a proclamação da Republica, inicio as questões por como vemos Pedro II nos dias de hoje. Para se chegar até o mais longínquo do passado, inicio por duas situações do presente, nos muitos nomes de ruas, espaços e monumentos que me fazem retomar um pouco da história dessa personalidade estão: a escola do Rio de Janeiro e a estação de metrô em São Paulo que levam o mesmo nome.

O que posso dizer sobre a figura histórica,  para além do nome de Pedro II é pouco que sei sobre a história passada. Sei que foi imperador ainda em criança, fato que fez muitos questionarem na época sobre a maioridade. Sei que por ter passado grande parte de sua infância se preparando para o império e pelo que instituiu depois, sua reputação fora a de um erudito, um patrocinador do conhecimento. Sei que não conheceu a mãe, que faleceu pouco tempo depois do seu nascimento. Seu pai, ao sair do país e voltar a Portugal, deixou três pessoas encarregadas de tutorá-lo. E enquanto  não atingia a maioridade, o já coroado imperador, era governado - assim como o Brasil - por outra regência que tomava decisões políticas, e  sei também que isto resultou em brigas e rebeliões no país. 
Para que Dom Pedro II assumisse como imperador naquela época foi pensado e discutido sobre a diminuição da maioridade, coincidentemente esta discussão tem sido necessária nos dias de hoje, pretendendo conferir aos menores de idade um outro tipo de autoridade.
 Vemos o quanto à diminuição da maioridade penal é um assunto polêmico neste país, desde o tempo de Dom Pedro II. Quando olho hoje, os jovens alunos que ocuparam escolas em todo país em defesa do ensino público, penso que esta maioridade pode conceder uma autonomia desejável. Porém, a exemplo destes alunos, a idade com a qual Pedro II fora coroado foi, provavelmente, a mesma com a qual estes secundaristas iniciaram a luta em prol do ensino público, mas sei que a juventude não está toda representada nestes exemplos.
 Outras questões aparecem quando o assunto vem à tona, pois outros também são os adolescentes. Continuação no link abaixo:


sexta-feira, 28 de abril de 2017

Valor ou Valores?



Valor ou valores?


Banana is my business. – para ler após assistir ao filme que conta a história de Carmen Miranda
                                                                                                                                    
Valor ou preços?

   Uma das coisas mais comuns hoje em dia e ver e ouvir falar sobre o quanto "um professor deveria ganhar mais, pois é ele quem ensina tudo, até para os que ganham mais". A partir desse saber popular, resolvi destrinchar um pouco do que está envolvido no valor de algo, e para que isso ocorra devemos chegar a um preço, e neste texto, preço não é sinônimo de valor.

Se considerarmos o dinheiro como valor abstrato de algo, talvez possamos compreender essa diferença entre valor e valores de outra forma. Talvez ajude pensar que uma banana pode representar uma moeda,  pois como tudo tem um valor, uma banana poderia ser igual a um real, por exemplo. Cada país, portanto, tem uma moeda e esse dinheiro vale de formas diferentes. Em alguns países é preciso duas bananas para ser equivalente a uma moeda de lá. Até aí é fácil, esdrúxulo até, mas a intenção é se chegar no preço. Para se criar um preço, um valor para algo, muitos valores estão envolvidos.

 Quem fez, quem fabrica, quanto se gasta em material estes são alguns valores que devem ser somados para se chegar ao preço final. Porém, se cada um precisa colocar um preço pelo seu trabalho, teremos uma confusão de valores. Quanto deve valer o seu trabalho? E quanto realmente vale nesse mercado? Qual deve ser o parâmetro para se chegar ao valor de seu trabalho?

    Após esse valor de início temos que acrescentar o transporte, a  locomoção. Aí vem outra pergunta: quanto se gasta pra que o produto chegue até as mãos do consumidor? Transporte, (avião, caminhão, bicicleta), o depósito (frigorífico, gelo, armazém), e além disso o "como se paga". Porque existe um valor que se paga no ato a compra, a forma com a qual utilizamos o dinheiro: cartão de crédito, cartão de débito, ou com o antigo cheque. Tudo isso é somado ao quanto deve custar o produto. 

      Se a partir dessas três despesas acima listadas (mão de obra, material e transporte ou armazenamento) acertarmos um valor, teremos um preço. Um valor ajustado entre pessoas de uma mesma cidade ou um mesmo país, que se utiliza de uma mesma moeda para medir os valores. Podemos dizer que o: “– Tá pá quanto?” final está definido. Porém, ajustado o preço que incluiu todas as despesas citadas teremos um valor justificável; o que não significa ser justo. 

 O preço de algum produto pode ser justificável, mas não ser justo? Sim, se compreendermos justificável pelo tanto de gente por onde esse o produto passou, por onde esse objeto andou, é compreensível. Porém, pode não ser justo para o bolso de quem precisa comprar.  

      Não é justo, portanto, o preço de algo quando não há justiça neles. Parece óbvio, mas a não equivalência entre o que se ganha e o que se precisa gastar para viver é sempre problemática. Preços altos, com salários que não conseguem pagar as necessidades básicas, ou seja as compras necessárias para a subsistência torna o justificável, injusto. Não é justo, porque não cabe nas receitas de quem precisa comprar.

        Se ser justificável é diferente de ser justificado. Poderemos compreender  a mão dupla de se estipular um preço. Mas, então  quem deve ganhar mais: quem trabalha na terra, direto? Quem embala o alimento? Quem o vende? Quem o transporta? Quem guarda o seu dinheiro? Quem te dá formas de comprar, sem o dinheiro em papel?

Sim a intenção não é a de encontrar respostas, mas questionar o valor do trabalho de um professor hoje. Sabemos que alguns do poder executivo calculam a educação pública não pelo valor de quem produz, mas sim pela quantidade do produzido final. Neste caso, na educação, o produto final são os formados, os alunos que serão profissionais. Difícil essa conta.
E continuo me perguntando. Nesse mercado de valores quanto deve valer cada trabalho? Quando assisti ao filme “Banana is my business” também pensei sobre os valores. Sobre a importação, sobre as moedas. Imagino que para uma Carmem Miranda ter de lidar com o preço de uma cultura não deve ter sido fácil. O quanto os valores que uma outra cultura dava a ela e a cultura dela, a brasileira. E o quanto os brasileiros modificaram a cotação da personalidade ao ser "exportada.

      Exportar a sua cultura não deve ser fácil, imagino como é se descobrir um país exportador de bananas? E como é se descobrir um país importador de cultura? Penso também no valor de nossa cultura? Quanto vale importar? E quanto vale exportar nosso jeito de ver, de compreender, de pensar? Será que vale? Qual o preço seria justo para nosso conhecimento? Será que temos conhecimento de algo? Será que o que temos pode ser chamado de conhecimento? Será que é válido?  Quanto deve valer lá fora? 




TERRA DOURADA: hino 2



Hino 2

Terra adorada
        
               
      Um dia, uma aluna confundiu, disse que a terra dourada, Minas Gerais, as minas de nossa literatura de cada dia, era a terra dourada, abençoada e tal. Religiões a parte, usei o nosso hino para tratar sobre o assunto, polêmico ou não.

      "Terra adorada” ou  “terra dourada” será que temos a mesma relação com uma terra que é adorada e uma que é dourada? Na segunda teríamos apenas o trabalho de usufruir, extirpar dela o que pretendemos para que seja obtido o valor necessário. (E este, diga-se de passagem, nunca é o suficiente).

      Igualmente aos manifestos Antropofágico e Paubrasil ou os poemas piadas dos modernistas, surge a necessária reflexão do hino. Como então seria uma poesia que relesse agora a República? Como seria uma poesia que tivesse como sujeito tanto aquele o histórico, quanto o social? Como seria um hino relido nos tempos de hoje?  Como seria uma poesia que fosse descolonizada?

Tantas perguntas 


OUVIRAM DO IPIRANGA: hino 1

Ouviram do Ipiranga
              
       Sem saber se o que ocorre no Brasil é consequência da falta de canto do hino no dia-a-dia dos brasileiros, me pergunto sobre as novas versões e os novos significados para esse tal grito de independência do país que iniciou o processo da instituição da república. Pedro II assumiu o império ainda muito jovem, mas foi em seu império que houve a proclamação da república, certo? Penso que algo mais se relaciona entre a independência do Brasil e a proclamação da República. Mas o que?
       
       Neste momento retorno a análise do hino que tanto me ocupei nas aulas de sintaxe em língua Portuguesa. Para além do enjambement e das anástrofes presentes,  nas aulas usava as perguntas para analisar. Quem é o sujeito?

Ouviram do Ipiranga

      Será ouviram lá do Ipiranga o grito das margens plácidas? Se as margens de um rio gritaram, certamente foi pelo que ocorreu em Mariana. Se pensarmos no caso da catástrofe com o desabamento da barreira no rio em Mariana, sim. Talvez tenha sido uma espécie de premonição da Natureza, um clamor adiantado, um aviso.

           Será que as margens plácidas do rio é que ouviram o grito de um povo heroico? É possível, apesar de não se falar em povo naquela ocasião, nem em levante público, muito menos em manifestações. Se for o clamor do povo descrito na letra, também pode ter sido um aviso. Um alerta para tudo que começaríamos a passar desde 2013. Neste caso, nosso hino está ficando mesmo premonitório, uma espécie de guru.

           Quem é o sujeito? Foram as margens que ouviram o grito do povo? Ou foi o Rio Ipiranga que gritou, desesperado, do que está ocorrendo atualmente no Brasil?

 Tantas perguntas 

PEDRO II por uma Res-pública 2/2

Por uma Res-pública
Por uma releitura da proclamação da república, ou da Res-pública em 2 capítulos, por enquanto.

1.   2 Pedro II e o penal


Se compararmos o fato que ocorreu em São Paulo no metrô  da estação Pedro II com o que ocorreu no colégio Pedro II – ocupação dos alunos - teremos outra visão da mesma realidade. Estes dois eventos, ocorridos no ano de 2016, nos ajudam a ter um outro retrato da República do Brasil, proclamada já há tantos anos.

O crime que ocorreu na estação Pedro II do metrô pode ser considerado grave, não apenas pela morte, mas pelas pessoas envolvidas. Um vendedor de balas brutalmente assassinado por proteger a diversidade já seria assunto para muitos debates, inclusive para se pensar a maioridade penal.

Porém o que desejo questionar aqui é sobre a independência e sobre a liberdade. Neste assunto, tentando excluir o quanto for possível de nossas paixões, nossas emoções no  episódio do metro, poderemos ainda nos interrogar sobre o nível de autonomia que deve ter um sujeito. Se todo sujeito é social, então, qual seria a liberdade possível de um sujeito em detrimento da liberdade de um outro? O que deveria ser autorizado? E o que é realmente é autorizado legalmente? O que é autorizado informalmente?

     Essas perguntas que já foram feitas muitas vezes, sempre precisam se tornar centrais. Que autonomia temos sobre determinadas responsabilidades? Podemos até comparar os estudantes de colégios públicos, como o Pedro II, em uma comparação forçada, qual seria o crime cometido por eles, pelos alunos na ocupação? Para pensarmos nisso, talvez seja necessário pensar em tudo que representa uma tomada das escolas públicas por estudantes. Pensarmos em quanto vale o estudo hoje? Qual é a relação possível entre o que se paga e o que se tem de formação. E o que é formar hoje em dia?

      Numa época de informação sem censura, como a que temos por meio da internet, buscar a diferença entre formação e informação talvez seja uma função educativa, dentro ou fora das escolas.

       Pensarmos no tempo em que um colégio como o Pedro II foi fundado e por quê se torna também urgente. Pensarmos em como são educados os imperadores, como fora o nosso Pedro II, também está dentro desta pauta. Não precisa ir muito longe para compreender que a educação vale algo. Quanto vale o ensino público hoje? E o particular? Há alguma diferença? Quem financia cada um deles? Quem se beneficia de cada um deles?

       Talvez seja necessário este tipo de comparação, mesmo que sejam muito diferentes as questões, para que possamos compreender melhor o quanto é preciso descolonizar esse nosso olhar para que possamos enxergar a possibilidade de futuro que temos hoje. Refletir sobre o que foi feito no passado também pode ajudar a, de um jeito mais abrangente, o momento presente,  e isso é sempre urgente.

       Liberdade deitada em berço esplêndido.

Nessa caricatura, criada pelo Angelo Agostini em 1882 para a Revista Illustrada, D. Pedro II está sendo derrubado do trono (Foto: Instituto de Estudos Brasileiros – USP, São Paulo) retirada do site: http://www.editoradobrasil.com.br:81/blog-da-gabi/charges/



quinta-feira, 20 de abril de 2017

Pátria Educadora, pátria educadora?


(Escrito em  outubro de 2015, 
publicado com revisões em abril de 2017)

      Tudo que diz respeito a mim, eu leio. Educação, principalmente, eu leio; pois além de dizer de minha profissão, também fala sobre o futuro. Talvez não mais sobre o meu futuro, mas o dos meus familiares descendentes. E observando comecei a compreender de  outra forma o slogan que me agoniava: “Pátria Educadora” do governo anterior.

      Eu me perguntava sempre o porquê de conter, em todas as aparições públicas, o mesmo slogan, creio que ainda estaria se fosse o mesmo governo: Pátria Educadora. Sempre, ao fundo se destacava.

      Depois de muito me questionar sobre esse assunto, chego à conclusão de que o lema estava certo, apesar de tudo. Talvez não como slogan, como propaganda de um governo, talvez represente mais  como alerta. Se pudesse ser questionado toda a vez que fosse lido, melhor. Assim eu fazia e como eu também outros deveriam perguntar: por que educadora? Eu entrava em sala de aula com tantos problemas, os mesmos de tantos anos. Mas porque educadora?
      
      Além de todos os percalços, considerados naturais, da escola, compreendi a mudança. Pois agora não é mais só a escola que educa, quem forma, ou quem dá a possibilidade de transformação. Nem só da família pode vir esta função. Já tem sido diferente,  e talvez sempre o fora. O efeito do lema agora é o de nos chamar atenção para os espaços: é da pátria, mais do que nunca,  dos espaços públicos ou privados, dos espaços virtuais ou reais que vem a função da educação. A pátria, o país, as redes sociais, a internet, as ruas são espaços em que se faz a educação no Brasil. Quiçá no mundo também seja assim: pátrias educadoras.
      
      São os espaços, além dos muros da escola, que formam ideias e ideais. Mesmo sabendo que vivemos em uma bolha nas redes sociais, que só visualizamos assuntos os quais concordamos ideologicamente, mesmo sabendo que podemos estar restritos ao que nossos amigos ou conhecidos pensam. Ali também nos formamos, discutimos sobre muito.  Grande parte do que é lido pode e deve ser descartado, é verdade. Notícias falsas devem ser lidas para que não sejam mais compartilhadas. Mas o jeito de se vestir, os autores que procuramos por ler e mesmo nas discussões, estamos sempre nos educando, uns aos outros, mais velhos ou mais novos, a favor ou contra qualquer coisa.

      Também tem sido assim nas escolas, nas ocupações feitas pelos alunos. A educação, como conhecemos, deixou de ser realizada apenas nas salas de aula, a TV deixou de ser esse local único em que atuávamos como meros espectadores.  Cabe a nós agora filtrar esse tanto de opinião, mais esse tanto de informação, transformar em atitude o que conseguirmos captar desse montante de vozes. O papel de educador agora é do Brasil como um todo. E você qual tem sido o seu papel como educador?



domingo, 2 de abril de 2017

Professora refém: desabafo

      Quando eu comecei a dar aulas no Estado eu  cheguei toda empolgada, com uma ideia e um monte de ideais, ah...eu queria levar tudo o que eu tinha posto em prática lá no outro local em que eu trabalhava, em um projeto social...eu adorava.
      Eu gosto de ser professora, mas ai veio uma turma que me fez pensar diferente. Foi  aí que eu entendi o que é o professor refém! A escola  do estado é toda detonada,  eu entrei na sala e eram 40 alunos  e não tinha livro, não tinha ventilador, não tinha xérox não tinha giz... nada!
      Aí eu passei o exercício no quadro e distribui os textos. De repente veio uma  aluna lá do fundo  e se jogou na minha mesa, deitou  assim e disse: qual é professora, me dá a resposta aí...       Eu fiquei tão chocada que eu não soube nem o  que dizer ... e ela bateu na mesa e disse: 
    _ Não vai me dar a resposta não? 
      Eu respirei fundo e  pedi _  Não,  querida, você vai voltar pra sua mesa, vai sentar. Ta? Tente fazer  o exercício  que no final eu vou dar a resposta  pra toda a turma.
      Aí ela  levantou e foi pela sala até la no fundo  gritando: 
     _Ah é né, não vai me dar a resposta não? A sra vai ver.... A sra vai ver.....Disse ameaçando. Ela queria me amedrontar, e conseguiu. 
       No segundo dia de aula nesta turma, eu entrei  na sala e a turma estava quieta,  um burburinho  estranho. Quando eu fui sentar na cadeira....eu puxei assim pra sentar...E quando eu coloquei a mão eu senti um negócio molhado, fui ver... era cola, era super bonder!
       Eu ainda fiquei um segundo ali parada com os dedos juntos... maior silêncio na sala....e... eu...
      Sabe quando você tá pra morrer e a sua vida passa toda na sua frente .. a minha passou ali, toda a minha vida de estudante, ....tudo que eu já havia aprontado com  os meus, toda a minha vida profissional...me veio subindo uma coisa,  e não deu pra ter pena  olhei pra turma,  e comecei a berrar, um monte ...nem  me lembro mais o quê,  eu saí de mim naquela hora.  
      Foi o meu momento de meter medo neles....Quando a diretora chegou é que eu  me assustei e dei por mim. Nossa ela também era assustadora, um cabelo todo espigado, amarelo ovo e um olho profundo com  uma especie de olheira  preta em cima e em baixo feita de  uma camada grossa de cajal que derretia   por causa do  calor  e.... Eu ... meu deus.... naquela sala......com aqueles alunos....e toda a situação do  ensino... Meu deus! 
Foi aí que eu pensei..... o que é que eu tô fazendo aqui........


    (Este texto foi escrito há 10 anos atrás, e eu ainda continuo professora do Estado do Rio. Com alguns dos mesmos problemas. O text foi escrito em uma aula de video com Flávio Colatrello Jr.)

Outra Canção de Exílio

Sobre o mundo de lá, visto daqui

Parece que não é só moda  brasileiros saírem daqui em busca de novas perspectivas de vida em outros países. “O último a sair apague a luz” ou a habitual mudança efetiva de amigos e vizinhos pode ser vista de outra forma, sem que seja “a grama do vizinho é mais bonita”, até porque às vezes é mesmo.

 Tanto pode, que os teatros municipais da Europa são como os do   Brasil, ou o contrário.  Como nasci aqui, para mim os daqui vieram primeiro, mas na história do tempo não foi assim. Essa repetição de paisagens não ocorreu apenas nas poesias do Arcadismo. Muito do que se vê de cidades brasileiras hoje, são cópias do que, em algum momento, foram cidades da Europa.

Apesar da repetição de construções por aqui, com construções de prédios e casas iguais, mas localizados em estados diferentes na atualidade, vemos repetições de paisagens urbanas  também lá fora. Hoje em dia a repetição tem se tornado tão comum que se chegarmos em algum lugar lá fora, EUA ou Europa veremos as mesmas lojas que temos aqui, muitas. Starbucks McDonalds entre outras. É, parece que a nossa matéria prima ainda continua sendo industrializada, e agora parece que também somos um bom mercado consumidor.  
Quando viajei a primeira vez para fora do Brasil em 2014, foi com o intuito de conhecer os países mais antigos e descobrir coisas novas, ou encontrar algo daquela inspiração de tantos e todos teóricos já lidos e estudados por mim. Mas a surpresa foi outra.

Quando cheguei na Europa, me deparei com tantas lojas como as daqui que até desanimei. A moda era a mesma. O café aguado era o mesmo de uma franquia estrangeira muito famosa por aqui. Ué? Mas o Brasil não era a terra do café? Será? Se continuamos a exportar essa matéria devíamos ao menos receber um bom produto por isso, principalmente pelos preços caros que pagamos aqui, pensei eu ao beber esse café aguado de lá.

Sem dinheiro para fazer uma viajem de férias dos sonhos, com o dinheiro contadinho fui fazendo a transposição de cada água que bebia em Euro, para o nosso preço. Qual não foi a minha surpresa!! Me avisaram para que não fizesse isso. Estarrecida fiquei. Surpresa fiquei por perceber que pagávamos aqui no Brasil, no Rio de Janeiro, um preço igual ao cobrado em euro!!! Um refrigerante lá era o mesmo valor que pagacamos aqui num restaurante. Comprar comida, para fazer em casa lá, era tão mais barato lá quanto é aqui.
Uma brincadeira essa que faço agora,  que sempre faço com os meus alunos,  reescrever a Canção do Exílio, aí vai uma professora,  brincando de aluna com seus próprios exercícios:

Outra canção de Exílio

Exilada estou em minha casa
Não posso mais sair
Fui conhecer o estrangeiro
nos idos tempos de dinheiro
Mas voltei ligeiro 
para o meu país

Saudade me deu de cá
mas eu bem queria voltar lá

Fui tocada pela imensa passarada
Teóricos que haviam por lá
Mas apesar de muito falada
A terra tão adorada não era essa daqui
Era a de lá

As moedas diferentes
Fui fazendo a cotação
dia sim e outro não
Nossa moeda não tem a mesma vida
Nossa vida de compras não tem o mesmo valor

Em cismar sozinha a noite que mais prazer encontraria eu lá
Na minha terra o café é mais gostoso
Tem gosto, e vem de cá

Fui buscar lá os primórdios pensadores
De tudo que eu aprendi por cá
E encontrei, é verdade, muita vaidade
Tanto quanto vejo nos teóricos da nossa terra

Permita deus que eu volte
Quero ter outra impressão
Que eu possa ver outras paisagens
sem ser aquelas lojas que aqui já vi de antemão 

Exilada em minha casa
não posso sair mais
tudo está tão caro, 
e o professor sem salário
teimando em sub-existir

Se a finança permitisse
que outros países eu visse 
voltaria sempre pra cá
por enquanto viajo em pensamento
esperando pelo momento 
do salário valer mais

Muitos são os que agora 
procuram o país de fora 
com o mar dividindo terras 
Preferem  o de lá

Eu continuo aqui
esperando melhorar
certa de que aqui é o meu lugar
esperando para a luz pagar

leia a poesia original e outros : Canção do Exílio e intertextos


Perguntas de uma professora que lê: valores e conhecimento

Sim, este é  um quase poema, um quase intertexto do que escreveu Bertod Brecht - Perguntas de um operário que lê 

Mais um exercício que costumo fazer com os alunos,  feito agora por mim.


O conhecimento vale muito,
Vale a pena ter.
O conhecimento é propriedade?
Deve-se ter?

Vale conhecer.
Mas quanto vale? Se em cada saber, se em cada conhecer, se em todo o ensino eu pago.
Mesmo que seja público o ensino, eu pago. Eu pago quanto?

Eu pago a quem? A quem pago pelo conhecimento?
A instituição da escola? Ao professor?Ao governo?
Eu decido sozinho o que deve ser o conhecimento necessário para as próximas gerações?

Que conhecimentos eu pago?
Que conhecimento é pago?

Alguém diz o que devemos aprender.
Quem é que diz o que o certo?
Quem diz o que se deve aprender?
Nos manuais de currículo mínimo está o que devemos ensinar. Quantos anos leva  para se criar um currículo mínimo?
Quem o cria?
Será que nele está o fundamental, o necessário para o saber de hoje?
O que está no currículo oficial ainda é o mais importante?

Voltemos a pergunta inicial  sobre o valor do conhecimento.
Se o conhecimento também vale, será que ele vale sozinho?
Será que ele vale sempre a mesma coisa?
O valor do conhecimento como pode ter um preço, mas são tantos os valores. E quem  é que paga por isso?  
O valor dorme em berço esplêndido, enquanto tudo aumenta.
Mas o valor mesmo, o quanto vale a você  e para mim, sempre é diferente. Eu valorizo mais isso, esse saber; você valoriza mais aquilo.

Aí, se complica,
Por que o que é valor aqui, neste país, em outro país não vale?
O que era um aqui, acolá vale dois.
Como pode, ora pois?
São tantos os conhecimentos, tantos são os valores...


Justiça é ? Deixemos essa pra depois.

Uma ficha de aula com a poesia de Brecht:
http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=9861